Em quartos meticulosamente organizados, com berços, roupinhas, fraldas e mamadeiras, mulheres adultas vivem uma rotina que se assemelha à maternidade. Mas, no lugar de um bebê de verdade, está uma boneca — realista ao ponto de enganar até os olhos mais atentos. São os chamados bebês reborn, um fenômeno que tem ganhado força nas redes sociais e gerado debates acalorados sobre os limites entre afeto simbólico e saúde mental.
Para algumas mulheres, especialmente aquelas que enfrentaram luto perinatal, infertilidade ou episódios de depressão, os reborns funcionam como uma forma de terapia. “É uma maneira de elaborar o trauma, dar forma ao sentimento e transformar a dor em cuidado”, afirma a psicóloga Renata Oliveira, especialista em saúde emocional feminina. “Quando usados com consciência e orientação, esses objetos podem ser extremamente acolhedores.”
Contudo, nem sempre o envolvimento com os reborns permanece em uma esfera saudável. Em alguns casos, o vínculo com a boneca se torna tão intenso que começa a afetar a vida funcional da pessoa — interferindo em relações sociais, profissionais ou familiares. “O problema surge quando a fantasia passa a substituir a realidade e isola o indivíduo do convívio humano”, reforça Renata.
As redes sociais têm potencializado essa relação. Vídeos com milhões de visualizações mostram “rotinas maternas” com os reborns, incluindo banhos, alimentação e passeios. Algumas criadoras de conteúdo narram partos fictícios e montam enxovais completos, atraindo outras mulheres que se sentem acolhidas por uma comunidade que entende suas dores e desejos.
Esse acolhimento, no entanto, também levanta preocupações. “É importante que o uso dos reborns venha acompanhado de reflexão e, se necessário, de acompanhamento psicológico”, diz o psiquiatra Mauro Salles. “Não é a boneca em si que é problemática, mas o papel que ela ocupa na vida daquela pessoa.”
Além do uso terapêutico, o reborn é também uma expressão artística. Criadores dessas bonecas dedicam horas à pintura e montagem para alcançar a aparência mais realista possível. O mercado movimenta valores expressivos, e algumas peças chegam a custar mais de R$ 5 mil. A arte, o afeto e o comércio se entrelaçam nesse universo delicado.
Em última análise, o fenômeno dos bebês reborn evidencia a complexidade das emoções humanas. Para alguns, eles são ferramentas de conforto. Para outros, um alerta silencioso de que algo mais profundo está em desequilíbrio. O desafio está em reconhecer a linha tênue entre cuidar e fugir, entre simbolizar e evitar.
“A pergunta que sempre deve ser feita é: essa prática me ajuda a viver melhor no mundo real ou me afasta dele?”, conclui a psicóloga.
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