Dos eleitores que podem ir às urnas de todo o país em 7 de outubro, 52,5% são mulheres. Porém, entre as propostas dos candidatos à Presidência, consolidadas nos programas de governo registrados pelas campanhas no TSE, as mulheres não são mencionadas em 4 de 13.
Dentro do universo das propostas que visam especificamente as mulheres, a disponibilização de creches e a promoção da igualdade salarial são as que mais aparecem. Ambas constam em sete programas de governo.
Segundo dados do último Datafolha, na pesquisa espontânea, 51% das mulheres não sabem em quem votar ou votam nulo ou branco. Esse número é de 29% entre os homens. As mulheres também estão menos convictas de seus votos: 47% delas dizem que seu voto ainda pode mudar, contra 31% dos homens. No cenário dividido e concorrido desta eleição, em que o eleitorado feminino pode ser decisivo, alguns programas de governo se detiveram em ações voltadas a elas.
“As mulheres têm uma contribuição fundamental para a economia e para a organização da sociedade. No entanto, não são reconhecidas”, diz Tatiana Oliveira, cientista política e pesquisadora da UERJ. Segundo ela, as políticas públicas para as mulheres são importantes para suprir essa falta de reconhecimento.
Porém, num momento em que reformas são emergenciais, a preocupação com igualdade e inclusão parece menos urgente. “A pauta de inclusão das minorias não é um assunto prioritário das campanhas”, avalia Mariana Deperon, mestre em direito, especialista em estudos de gênero e sócia-fundadora da Tree – Consultoria e Educação em Diversidade. “Educação, saúde e políticas de inclusão não são olhadas com grandes lupas.”
Nos programas de Álvaro Dias (Podemos), Cabo Daciolo (Patriota), Eymael (PSC) e João Amoêdo (Novo) não se encontra a palavra mulher. Dias, que cita o termo mãe, e Amoêdo, contudo, têm entre suas propostas a expansão do acesso às creches. As creches, que recebem crianças de zero a três anos, garantem que as mulheres possam trabalhar e estudar.
Além de Dias e Amoêdo, Ciro Gomes (PDT), Guilherme Boulos (PSOL), Henrique Meirelles (MDB), o programa do PT (registrado no TSE antes da oficialização de Fernando Haddad como candidato) e Marina Silva (Rede) apresentam proposições relacionadas ao assunto.
De responsabilidade dos municípios mas com apoio dos governos estaduais e federal, creche é tema há anos das campanhas, também estaduais e municipais. Entre os três primeiros colocados nas presidenciais de 2010, os programas de Marina e de José Serra (PSDB) davam conta do tema, assim como, em 2014, os de Marina e de Aécio (PSDB).
O interesse não é à toa. Segundo dados do IBGE, em 2015, 71% das mulheres com 15 anos ou mais, em algum momento da vida, já haviam tido filhos.
Na opinião de Deperon, porém, “a mudança de chave para a mulher no ambiente corporativo” está na licença parental, numa legislação que garanta um período de afastamento do trabalho maior, para homens e mulheres, que pode ser repartido entre mãe e pai.
O tema aparece apenas no programa de governo de Marina deste ano, que propõe o “compartilhamento dos cuidados dos filhos com os pais”, ampliação da licença paternidade e uma “transição gradual para um sistema de licença parental”.
“Desde o recrutamento, mulheres são perguntadas, muitas vezes, sobre casamento e maternidade. Essas questões não chegam aos homens”, afirma Deperon.
Também surge em sete dos programas dos presidenciáveis, de diferentes maneiras, a garantia de equiparação salarial entre homens e mulheres. O tema aparece nas páginas de Ciro, Boulos, Meirelles, João Goulart Filho (PPL), PT, Marina e Vera Lúcia (PSTU).
O assunto foi motivo de enfrentamentos e campanhas presidenciais, como no embate entre Marina e Jair Bolsonaro (PSL) no debate promovido pela Rede TV. O deputado federal afirmou, num programa de TV em 2016, que “não empregaria [homens e mulheres] com o mesmo salário”.
Em 2010, a equiparação salarial não estava em nenhum dos programas dos três candidatos mais votados naquele ano: Dilma Rousseff (PT), Serra e Marina. Genericamente, o programa do PSDB falava em “combate à discriminação entre gêneros no trabalho”. Já na corrida de 2014, o programa de Marina fala em estabelecer “salários iguais para funções iguais”.
A descriminalização do aborto, bandeira histórica da luta feminista, aparece claramente como proposta dos candidatos Boulos e Vera Lúcia. Cabo Daciolo é o único candidato que se posiciona contra o aborto.
Outro assunto frequente nas falas de candidatos também tem uma das menções mais numerosas nos programas: o combate à violência contra a mulher, citado em 6 dos 13 programas. Ciro, Geraldo Alckmin (PSDB), João Goulart Filho, o programa do PT, Marina e Vera Lúcia apresentam propostas para atender, na saúde e na segurança, vítimas de violência doméstica. Em 2010, apenas o programa de Serra tratava do assunto.
Em 2014, os programas dos três presidenciáveis mais votados abordavam o tema.
“Vemos agora uma maior visibilidade desse tipo de crime porque inventamos um nome para ele, feminicídio, e em função dos índices brutais, também de lesbofobia e transfobia”, diz Oliveira.
Segundo levantamento da Associação Nacional de Travestis e Transexuais em parceria com o Observatório da Saúde LGBT e com o Núcleo de Estudos em Saúde Pública da Universidade de Brasília, 179 pessoas trans foram assassinadas no Brasil em 2017.
As mulheres trans são, geralmente, incluídas nas propostas que tratam da comunidade LGBT. “Os direitos da mulher trans eram um tema tabu, e as políticas públicas seguem os temas da sociedade”, diz Deperon.
Os programas de Boulos, Ciro, Haddad e Vera Lúcia apresentam propostas voltadas especificamente à garantia dos direitos de transexuais, como equiparação do crime de LGBTfobia ao de racismo, garantia ao nome social nos documentos e programas de educação. Em 2014, Marina propunha incentivos à educação e à regulação da mudança do nome civil ao social, e, em 2010, Serra falava em combate à violência.
“A mulher trans está completamente marginalizada na sociedade, ela não tem nem sequer formação para alcançar posições melhores de trabalho”, completa Deperon.
Neste ano, entre todos os cargos em disputa nas urnas, 31,5% dos candidatos com pedido de cadastro são mulheres, segundo o TSE. Dentre os 13 presidenciáveis, apenas duas são mulheres.
O aumento da participação política e na administração pública das mulheres aparece apenas em três programas deste ano, nos de Ciro, Haddad e Marina. No passado, apareceu, em 2010, nos de Serra e de Marina e, em 2014, nos de Aécio e de Marina.
Segundo Deperon, a mulher nestas eleições está muito mais preocupada com a representatividade nas três esferas de poder. “Credito isso às mulheres da geração Y, mais engajadas na questão da igualdade de gênero e que dominam a tecnologia, bastante ativas nas redes sociais”, completa.
As questões relacionadas a gênero pautam, segundo o próprios textos, os programas de Marina, Ciro, Haddad e Boulos. A chamada transversalidade é a garantia de que todas as propostas, não só as diretamente ligadas às mulheres, levam em consideração a busca de igualdade. O programa do PT, por exemplo, expressa isso da seguinte maneira: “A busca da igualdade racial-étnica e de gênero balizará todas as políticas públicas, nas áreas econômicas, sociais, políticas e culturais”.
“São importantes políticas setoriais específicas, mas precisamos de uma mudança na visão de mundo para entender que todas as políticas são de interesse das mulheres”, diz Oliveira.
Propostas para mulheres nos programas de presidenciáveis
4 dos 13 programas registrados no TSE não mencionam a palavra mulher
Acesso a creches e igualdade salarial aparecem em 7 programas
Combate à violência doméstica está em 6 programas; o assunto era o único presente em todos os programas dos três mais votados em 2014
4 programas tratam de direitos das mulheres trans e trazem propostas específicas para a saúde da mulher
O estímulo ao aumento da participação feminina na política está em 3 programas
2 programas propõem recriação de pasta específica para mulheres no governo federal
Proposições dos cinco candidatos à frente nas pesquisas
Jair Bolsonaro (PSL)
– combater o estupro de mulheres
Fernando Haddad* (PT)
– Ministério das Mulheres
– paridade de gênero na composição das listas de candidatura
– isonomia salarial
– ampliação das vagas em creches
– enfrentar o feminicídio
– enfrentar a mortalidade de travestis e transexuais
– titularidade prioritária a mulheres nos programas da reforma agrária
– promover saúde integral da mulher para pleno exercício dos direitos sexuais e reprodutivos
– nacionalização do programa Transcidadania
– estruturação nacional do futebol feminino
Ciro Gomes (PDT)
– recriação da Secretaria das Mulheres
– igualar número de homens e mulheres em posições de comando do governo federal
– garantia da igualdade de salários entre homens e mulheres
– adoção, melhoria e multiplicação de creches informais (sem vínculo com sistema público, mantidas por por entidades assistenciais e ONGs) e maior oferta de creches, com prioridade às jovens mães
– “eliminação de material escolar que reforce o papel da mulher como menos apta ao mundo da produção ou mais apta à esfera doméstica”
– prevenção da violência contra mulheres
– combate à violência obstétrica
– enfrentar a transfobia
– “controle social do uso depreciativo de imagem de mulheres negras”
– fomento à aprovação da Lei João W. Nery (Lei de Identidade de Gênero)
Geraldo Alckmin (PSDB)
– promover o respeito às mulheres
– pacto nacional para redução da violência contra mulheres
– criação de redes não-governamentais contra tráfico sexual
– prevenção da gravidez precoce
Marina Silva (Rede)
– ampliação da participação política
– políticas para igualdade de oportunidades e salários
– ampliação da licença paternidade
– ampliação de vagas em creches
– combate ao feminicídio
– enfrentamento do tráfico de pessoas
– enfrentamento do turismo sexual
– promover ações de saúde integral da mulher e de seus direitos reprodutivos e sexuais
– estímulo ao parto humanizado
*O registro do programa do PT no TSE foi anterior à confirmação de Haddad como candidato do partido
Folha de SP
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