“Não é fácil… Sofro todos os dias, para chegar no transporte público e acontecer aquilo”, lamenta Ana Cláudia Falcão Rodrigues, 46 anos. Ela, que é mãe de duas crianças com transtorno do espectro autista, foi agredida dentro de um ônibus, na manhã desta terça-feira, 02, em Salvador, por outra passageira que estava no veículo. Os filhos dela testemunharam a agressão, que também foi registrada em vídeo.
Abalada e sem conseguir conter o choro, ela contou ao Portal A TARDE os detalhes de como tudo aconteceu. Segundo Ana Cláudia, quando ela, o marido e os filhos entraram no coletivo, o veículo estava cheio, mas não completamente. A agressora estava ocupando um lugar no banco reservado para prioridades, e então o esposo de Ana Cláudia sentou no espaço livre, com a filha no colo, enquanto ela ficou em outro lugar.
“Os passageiros do ônibus então começaram a comentar: ‘Que absurdo’, começaram a falar alto… Aí falaram: ‘Vá lá que ela vai levantar’. Eu levantei e fiquei em pé ao lado do banco onde a mulher estava,, mas ela não levantou; quem levantou foi meu esposo”, relata.
“Aí eu sentei do lado dela, e ela colocou o dedo na minha cara e ficou gritando: ‘Você sabe com quem você está falando?’. Depois ela me agarrou e começou a me agredir. E ela repetindo: ‘Você não sabe com quem está mexendo, você não sabe o que vai acontecer com você’. Ela também falou: ‘Eu sento aqui todo dia e é aqui que vou ficar. Ninguém vai me tirar’”, acrescentou Ana Cláudia.
Com a confusão, o motorista do ônibus parou no bairro de Roma, quando avistou uma viatura da polícia. “Os policiais então entraram, ela [a agressora] alterada, gritando com os policiais. Então os policiais disseram que teríamos que ir para a delegacia para registrar a ocorrência”, conta a mulher, que disse ainda que o caso foi registrado na 3ª Delegacia, no Bonfim.
Muito Abalada
Pela tarde, já em casa, Ana Cláudia ela ainda estava bastante emocionada.
“Eu não gosto de usar essa expressão, porque sou crente em Jesus, mas eu senti muita raiva. Mas não aquela raiva de desejar mal para alguém, mas aquela coisa… Deus, eu luto tanto! E ter que passar por isso… Vêm essas coisas na cabeça. E não saber o que fazer, ficar sem reação. Porque eu luto tanto por isso, pelos direitos básicos de meus filhos, direito de sentar num transporte público. Aqui no fim de linha da Massaranduba, os rodoviários me ajudam tanto. Eles já conhecem, já sabem de minha luta”, falou a mulher, sem conseguir conter o choro.
Ana Cláudia explica que o filho dela, que tem quatro anos de idade, além de autismo, também foi diagnosticado com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH). Já a filha, que tem 10 anos, também possui seletividade alimentar, condição que é caracterizada principalmente por recusa alimentar, repertório restrito de alimentos e ingestão frequente de único tipo de alimento.
Ela conta que há oito anos, dedica a vida totalmente aos dois filhos com autismo. “Eu não faço mais nada. Eu larguei meu emprego quando minha filha tinha dois anos, para viver exclusivamente para eles. Porque eu quero ver meus filhos melhorarem”, diz Ana Cláudia, que atuava como administradora em um cartório.
Meu filho era nível 3 não verbal, e hoje ele é nível 2 e fala, porque todo dia a gente corre atrás de terapia. Antes, meu filho só ficava batendo a cabeça na parede, se machucando, e hoje ele fala e vai para a escola. Escutar o médico elogiar a gente…”, destaca Ana, emocionada com o avanço que vem conseguindo com os pequenos.
Ela, no entanto, ressalta que ainda precisa lutar todos os dias em nome dos filhos.
“Minha filha só come macarrão todos os dias, por causa da seletividade alimentar. Eu gostaria que ela comesse frutas, alimentos saudáveis, mas essa condição é difícil. Outro dia, tivemos problema na escola, porque a professora tentou forçar ela a comer uma uva… É uma luta diária”, conta.
Ela revela também que, atualmente, está buscando sem sucesso garantir o Benefício de Prestação Continuada (BPC) para a filha. O benefício pode ser solicitado por pessoas diagnosticadas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) consideradas incapazes de se manter sozinhas e cuja renda de cada pessoa do núcleo familiar, a chamada renda per capita, seja limitada a um ¼ do salário mínimo vigente.
“No INSS, negaram o benefício para minha filha. A perícia disse que minha filha é apta para trabalhar. A gente enlouquece com essas coisas. O advogado agora colocou na Justiça Federal, para ver se a gente consegue”, diz.
Ana Cláudia conta que não foi só ela que ficou abalada com a agressão. Os dois filhos também sofreram muito emocionalmente.
“Só queria não ter passado por isso. Eles não podem me ver chorando, que eles choram também. É muito difícil. Muito! Minha filha dizendo que não quer mais entrar em ônibus… Mas a gente não tem carro, e a gente faz tratamento na Barra. Se ela não entrar em ônibus, o que é que eu vou fazer?”, questiona a mulher.
“Eu não preciso mentir, não preciso inventar nada. A gente tem que ter só um pouquinho de empatia, se colocar no lugar da pessoa e ver que não é fácil”, conclui.
A Tarde
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